Carlos Bolsonaro: em um relacionamento aberto com a Câmara do Rio de Janeiro
Humberto Dantas
18 de junho de 2019 | 14h45
Texto construído em exercício coletivo com alunos da disciplina de Análise Política do curso de especialização em Ciência Política da FESP-SP.
De acordo com seu regimento a Câmara Municipal do Rio de Janeiro realiza suas sessões ordinárias às terças, quartas e quintas-feiras das 14h00 às 18h00. A exemplo de cidades como São Paulo, obviamente o horário comercial afugenta o cidadão comum que deseja acompanhar de perto o Legislativo e pressionar seus representantes. O que esses representantes fazem? Como agem? Aqui buscamos conhecer um pouco da realidade da segunda maior casa parlamentar municipal do Brasil e do mais conhecido e influente vereador do país: isso mesmo, um edil de projeção absolutamente nacional.
Tendo em vista que Carlos Bolsonaro (PSC – ele ainda não pôde sair da legenda pela qual foi eleito em 2016) esteve muito ocupado com a campanha do pai em 2018, e que hoje parece mais envolvido com o governo federal que com sua própria função pública, o que ele efetivamente faz na Câmara Municipal? Essa resposta diversos meios de comunicação já tentaram nos dar, e concluíram: nada, ou muito pouco.
A revista Piauí, em fevereiro de 2019, dizia que colegas “alegam que ele faz poucos discursos e poucas vezes foi visto na Tribuna”. Ele é o famoso parlamentar que não parla. O Antagonista afirmou no fim de 2018 que ele estava voltando da quarta licença não remunerada seguida depois de acompanhar a campanha de Jair Bolsonaro. Seu gabinete fica montado, Fabrício Queiroz é acusado de contratar fantasmas, o suplente não assume o poder e a Câmara fica cerca de 2% menor, com 50 vereadores, e não com 51. O salário (subsídio) talvez seja poupado, mas tal montante equivalia a apenas 30% do que um gabinete custava em 2016.
Legislar, a exemplo do pai, Carlos pouco legisla. Em 2019, nenhum pronunciamento e autoria de projetos apenas em parceria. De acordo com a Revista Época, foram somente 16 leis aprovadas em 18 anos de mandatos acumulados, o último conquistado com mais de 100 mil votos e doações de funcionários do gabinete federal do pai. O primeiro, em 2000, aos 17 anos, rivalizando eleitoralmente com a própria mãe para atender a um pedido de Jair.
Fiscalizar, pouco fiscaliza. A cidade vive às voltas com o impeachment de Marcelo Crivella, e como atua o vereador? É um representante dos mais comuns possíveis: daqueles que têm voto, notoriedade e baixo impacto legislativo.
Mas em Brasília a história é outra. Nas suas contas em redes sociais, ele até fala sobre o Rio de Janeiro, mas o plano federal impera. No Twitter, entre janeiro e março, aparece muito conteúdo local, sobretudo quando acaba o recesso carioca. No Instagram, de 404 posts entre janeiro e junho, quase um terço defende o governo de Jair Bolsonaro, e menos de 10% falam sobre a Câmara do Rio de Janeiro. Outra conta, apresentada pela imprensa em meados de janeiro, mostrava que ele havia sido mais recebido pelo pai do que 18 dos 22 ministros. Nas redes sociais ironizou: “não posso mais visitar meu pai”. Hoje ele é acusado de interferir diretamente na demissão de dois ministros – Bebianno e Santos Cruz. Tudo isso pode parecer bizarro, mas trata-se de recolhimento de informações de diferentes portais de notícias pela internet. O que parece não fazer ainda mais sentido é como a Câmara Municipal atual.
O parlamento local registra mal as informações sobre os vereadores, e explica sem grande clareza como funciona. Ou seja: o parlamento do Rio de Janeiro também é extremamente comum, e infelizmente pouco claro. Por exemplo: entre agosto de 2018 e maio de 2019, Carlos Bolsonaro teve apenas quatro faltas registradas em algo que o Legislativo chama de sistema de transparência. Não seria muito mais razoável anotar que ele está licenciado? Claro que sim. Não tenha dúvidas.
Em 28 de novembro, em tese, ele voltou ao trabalho, e em dezembro registrou três faltas não abonadas. Após o recesso de janeiro, a Câmara voltou a trabalhar. E onde estava Carlos Bolsonaro? De acordo com os registros, no parlamento local. Lá ele é membro, por exemplo, da Comissão dos Direitos Humanos. O grupo composto por três vereadores não deve ter absolutamente nada para fazer numa cidade “desenvolvida” e “igualitária”. Veja os números: em 2018 a Prefeitura falava em 4.628 pessoas em situação de rua, de acordo com o G1. O levantamento é polêmico, pois contrasta com os mais de 15 mil de 2016. Segundo o IBGE, 31,4% dos cariocas viviam com renda nominal mensal per-capita de até meio salário mínimo também em 2016. E apenas no primeiro trimestre de 2019 foram quase 500 assassinatos registrados na cidade. Será que existe assunto para a citada comissão? Ao que tudo indica sim, mas na prática: não.
A ex-vereadora e colega de parlamento de Carlos, Marielle Franco (PSOL), por exemplo, foi assassinada em 14 de março de 2018. Exatamente uma semana depois, dia 21, o grupo de Direitos Humanos se reuniu por cerca de 30 minutos, elegeu sua presidente, o vice-presidente e um vogal, e encerrou os trabalhos. Mais nada, sequer um comentário. Se reuniria, de acordo com os registros da Câmara, depois de quase UM ANO para a mesma atividade eleitoral em 15 minutos, com Carlos sendo reconduzido à vice-presidência do único grupo permanente pelo qual “atua”. Em abril desse ano um fenômeno extraordinário: em menos de uma hora, a comissão resolveu fazer uma audiência pública e falou sobre a fiscalização de alguns abrigos para pessoas em condições de rua. Foi só isso, um verdadeiro pacto de mediocridade, ou em um “relacionamento aberto” onde aparentemente, sem grandes esforços para registros, cada um é senhor de sua vida.